domingo, 30 de agosto de 2009

Poemas 1 [Florbela Espanca]

Nunca Fui

Nunca fui como todos

Nunca tive muitos amigos

Nunca fui favorita

Nunca fui o que meus pais queriam

Nunca tive alguém que amasse

Mas tive somente a mim

A minha absoluta verdade

Meu verdadeiro pensamento

O meu conforto nas horas de sofrimento

Não vivo sozinha porque gosto

E sim porque aprendi a ser só...


Eu...

Eu sou a que no mundo anda perdida,

Eu sou a que na vida não tem norte,

Sou a irmã do Sonho, e desta sorte

Sou a crucificada... a dolorida...

Sombra de névoa tênue e esvaecida,

E que o destino amargo, triste e forte,

Impele brutalmente para a morte!

Alma de luto sempre incompreendida!...

Sou aquela que passa e ninguém vê...

Sou a que chamam triste sem o ser...

Sou a que chora sem saber por quê...

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,

Alguém que veio ao mundo pra me ver,

E que nunca na vida me encontrou!


Tortura

Tirar dentro do peito a Emoção,

A lúcida verdade, o Sentimento!

-- E ser, depois de vir do coração,

Um punhado de cinza esparso ao vento!...

Sonhar um verso de alto pensamento,

E puro como um ritmo de oração!

-- E ser, depois de vir do coração,

O pó, o nada, o sonho dum momento...

São assim ocos, rudes, os meus versos:

Rimas perdidas, vendavais dispersos,

Com que eu iludo os outros, com que minto!

Quem me dera encontrar o verso puro,

O verso altivo e forte, estranho e duro,

Que dissesse, a chorar, isto que sinto!!


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